
É fato que uma criança autista pode ter uma vida sem comprometimentos, contudo, para que isso ocorra, é importante que ela seja estimulada corretamente desde cedo, objetivando um desenvolvimento saudável que a permitirá alcançar sua independência. Alguns estudos, entretanto, afirmam que as crianças dentro do Transtorno do Espectro Autista (TEA) podem apresentar alguns prejuízos no comportamento social e intelectual antes dos 12 meses, enquanto a média de diagnóstico segue sendo 5 anos de idade, dessa forma, percebe -se um atraso relevante entre o aparecimentos das primeiras características e o começo da estimulação correta, com acompanhamento multidisciplinar.
Assim, é importante treinar o olhar não só dos profissionais de saúde que acompanharão a criança, como também o olhar dos pais, responsáveis, cuidadores, professores e das pessoas da rede de apoio daquela família. Esse cuidado atento proporcionará à criança uma melhor qualidade de vida e uma melhor exploração das suas capacidades.
O primeiro passo desse treinamento é ampliar o acesso a informação, fazendo com que os sinais de alerta, importância do diagnóstico e estimulação precoces sejam bem entendidos pela população, uma vez que, sabe -se da existência da deficiência no diálogo com as famílias, principalmente as mais vulneráveis, culminando no atraso diagnóstico como elucida o estudo “Cuidando de quem cuida: : um panorama sobre as famílias e o autismo no Brasil em 2020”. O segundo desafio é quebrar o estereótipo que desvaloriza a criança dentro do espectro autista e faz as pessoas à sua volta que assumirem uma posição negacionista, achando, ingenuamente, que com essa atitude estaria protegendo a criança das adversidades.
Quais sinais que devemos nos atentar?
Normalmente os casos leves só têm o diagnóstico fechado após os 4 anos de idade, porém, é possível observar alguns sinais antes do primeiro ano de vida. Lembrando que se esses sinais estiverem presentes é essencial procurar um profissional capacitado para avaliar, pois a maioria deles não é exclusiva do Transtorno do Espectro Autista. Listamos alguns dos sinais por idade a seguir:
Até 9 meses
Bebês muito calmos ou agitados demais
Bebês que não acalmam no colo do cuidador
Bebês que não reagem a sons
Redução ou ausência de contato visual durante as mamadas
Rejeição ou evitação do seio materno
Ausência de sorriso social em resposta aos estímulos dos adultos
Transtornos de sono
Ausência ou pouca vocalização ou balbucio
Poucas expressões faciais
Não demonstra interesse pela face do cuidador ("olha através do outro")
Não buscam a voz do cuidador e não seguem sons diferentes no ambiente
Dificuldade na aceitação da alimentação complementar (a partir de 6 meses)
Podem estranhar mudanças de rotina
9 meses a 12 meses
Apresenta pouca identificação pelo nome e não responde frequentemente quando chamado (não olha quando chamado pelo nome)
Dificuldade em compartilhar atenção (ex. não olha para algo que apontamos)
Comportamentos de imitação reduzidos
Redução de gestos
Estranham excessivamente as pessoas (é normal estranhar pessoas a partir dos 9 meses de idade, então esse sinal deve ser analisado no contexto)
Não estranha nenhuma pessoa após 9 meses também pode ser um dos sinais, deve ser analisado no contexto do caso
Estranham ambientes diferentes e pode permanecer alheio e hipoativo
Podem ser muito irritados
Interesse excessivo por objetos que giram ou brilham
Se concentra em partes pequenas dos brinquedos ou se interessa em excesso por objetos que não são brinquedos
Parece não compreender algumas situações
Dificuldade em manter o contato visual
Podem realizar movimentos repetitivos - estereotipias
Pouco interesse por outras crianças, principalmente pelas da mesma idade
A partir de 12 meses
Tendência ao isolamento ou apego excessivo a um cuidador
Resistente à mudanças de rotina
Pode apresentar interesses restritos a alguns brinquedos, objetos, desenhos, pessoas
Até 1 ano não balbucia palavras
Não apresenta gestos convencionais como dar tchau, mandar beijo
Regressão de habilidades já adquiridas
Pode andar na ponta dos pés
Não brinca adequadamente com os brinquedos
Enfileira ou empilha objetos
Até 1 ano e 6 meses não fala 5 a 10 palavras que todos entendam
Não obedecem ordens simples (ex. dá para mim, senta, levanta, pega…)
Aos 2 anos de idade não falam 100 a 150 palavras que todos entendam e não começou a falar frases simples
Vocabulário restrito ou vocabulário muito rebuscado para a idade
Dificuldade em interagir com crianças da mesma idade
Birras em excesso
Estereotipias quando está feliz, triste, excitado, irritado
Não aponta o que quer
Utiliza as pessoas como instrumento (ex. pega a mão do cuidador e coloca em cima do que quer)
Podem ter ecolalia - repetir sons, palavras
Seletividade alimentar
Após os 18 meses as características do autismo se tornam mais evidentes e é obrigatória a investigação pelo pediatra de qualquer atraso de contato social, linguagem verbal e não verbal, interesses restritos e repetitivos, estereotipias. A Academia Americana de Pediatria recomenda que toda a criança seja submetida a uma triagem para o TEA entre 18 e 24 meses de idade, mesmo aquelas que não estão sob suspeita diagnóstica de TEA ou outros transtornos, desvios e atrasos do desenvolvimento.
A triagem pode ser feita pela aplicação do M-CHAT e esse teste pode ser repetido em intervalos regulares de tempo. O M-CHAT é um teste de triagem e não de diagnóstico, nem todas as crianças que pontuam no M-CHAT serão diagnosticadas autistas. No entanto, nos casos de escores positivos é fundamental procurar avaliação especializada por médico especialista e equipe interdisciplinar o mais breve possível. O M-CHAT é um instrumento protegido por direitos autorais, devido a isso não pode ser reproduzido aqui, mas é facilmente encontrado em sites de buscas.
O autismo, não é uma doença, portanto não tem cura, porém a estimulação adequada é capaz de proporcionar uma melhora nos relacionamentos sociais, na comunicação e nas habilidades de autocuidado, permitindo à criança um melhor entendimento da sua realidade e desafios, bem como a preparação necessária para superá-los e viver com qualidade. Portanto, se no seu convívio tem alguma criança que se enquadra nesse contexto, tente conversar com a família para buscar ajuda profissional o quanto antes!

Este texto foi produzido como atividade do Projeto Padrinho Med.
O projeto Padrinho Med foi idealizado pela médica Flávia Ju e tem objetivo de aproximar os médicos dos estudantes de medicina, promovendo troca de experiências e produção de conteúdo tanto científico quanto informativo à população.

Autora do texto: Silvia Sayonara
Acadêmica de medicina da UFS- Universidade Federal de Sergipe
Coautora e revisora: Benaia Silva - médica neurologista pediátrica.
Para mais informações sobre a autora clique na imagem ao lado.
REFERÊNCIAS
Robins D, Fein D, Barton M, Resegue RM (Trad. Questionário Modificado para a Triagem do Autismo em Crianças entre 16 e 30 meses, Revisado, com Entrevista de Seguimento (M-CHAT-F/F)TM [Internet]. 2009 Available from: http://www.mchatscreen.com. [cited 2020 Jan 22].
SPB. Sociedade Brasileira de Pediatria. Transtorno do espectro autista. Manual de orientação. Departamento de pediatria do desenvolvimento e comportamento. Nº5, 2019.
SPB. Sociedade Brasileira de Pediatria. Diagnóstico precoce para o Transtorno do Espectro do Autismo é tema de novo documento do DC de Desenvolvimento e Comportamento, 2019.
Steffen, B. et. al. DIAGNÓSTICO PRECOCE DE AUTISMO: UMA REVISÃO LITERÁRIA. Revista saúde multidisciplinar. 6ª ed, 2019
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